Educação de Design para Adultos e Design Livre

Conversando com o Milton Andrade, ele me comentou uma situação curiosa. Para a pessoa com idade mais avançada, não é muito fácil “começar” na área do Design. É difícil conseguir um estágio, pois costumam querer pessoas que apenas sirvam de instrumento. Gente passiva. E é verdade: são poucas as empresas realmente interessadas em ensinar ao aprendiz, querem que já venha “pronto”. A relação com o Design Livre é imediata, afinal, ele busca abrir a participação no processo: aprender a fazer design, fazendo design. Isso já foi discutido no capítulo Pedagogia do Design Livre, no livro, mas a conversa com o Milton me permitiu aprofundar em algumas reflexão.

Entre as característica do Design Livre, entendo como fundamental esta vontade pela “abertura”. “Abrir” algo é permitir que ele seja tocado. Que possa tocar, pegar, tirar foto com flash, levar pra casa…  Uma abertura que permite que um projeto não seja só admirado, mas transformado com suas próprias mãos. E vejam só: isso acontece com a vontade de participar — no momento em que se deseja isso, ou seja, na hora em que a própria pessoa está mais aberta a apre(e)nder aquilo – o design, o projeto, o resultado do que fará. Para mim, isso tem muito a ver com Paulo Freire, que acreditava que a educação era feita pelo proprio educando, e realizada a partir da sua própria realidade. Seu método (método Paulo Freire) é uma articulação numa maneira de potencializar isso, e era uma crítica as métodos que vem “de cima para baixo”, dizendo que obrigatoriamente tem que ser assim ou assado, impondo conhecimentos e atrasando o aprendizado, que por fim resulta inertes para uma mudança na sociedade.

A maioria dos projetos que vemos são fechados: só vemos a ponta final, e não o processo. Como aprender os processos, se eles estão ocultos? A educação “não-formal” (pois aprendemos com nossos pais, com a TV, a internet, e não só na formalidade da escola!) de design se dá com desenhos de projetos. Apesar da maioria dos designers querer mostrar que Design não é (só) a ideia de desenho ou de beleza, quando se mostra e se fala em design, o que aparece é exatamente isto, é o que está disponível para aprendizado. Como esperar um entendimento mais amplo de design, assim?

O Design Livre tem um link claro com o Software/Hardware/Cultura Livre, já que estes bem antes já abriram o digital para encontrar suas vísceras. E, no meio dos 010101101010101, ao transforma-los, puderam perceber que o impacto disso é cultural, social, humano… Um desafio ao Design com Software Livre: não replicar a o processo do Design com Software Proprietário, onde o processo é hierárquico, vertical e por etapas, onde o designer acredita que ele é que pensa o projeto, e o resto executa. Que redução do potencial de tanta gente, como se algum trabalho não pudesse ser criativo! O Design Livre sem Software/Hardware/Cultura Livre  fica bambo, sem apoio: há abertura do lado e fechamento do outro.

Uma pergunta: quem é esse que faz design? A resposta, simplista, será: o designer. E como alguém se faz designer? Hoje, de certa maneira, é através de faculdade… livros… trabalho em empresas com design… mas não deveria ser, principalmente, realizando projetos, participando, vendo, descobrindo o fazer design? E se essa pessoa quer realizar projetos que mudem a sua realidade, terá como faze-lo apenas realizando projetos para afirmar exclusivamente a intenção de outro(s)? Quando é que realizamos nossos projetos?

Voltando ao início deste texto, que tal se, além de uma Educação através do Design, para crianças e jovens, como propõe o professor Fontoura, com o Design Livre fosse possível uma Educação através do Design para Adultos? Novamente, temos Paulo Freire, que ciente desta preocupação, contribui tanto para o EJA (Educação de Jovens e Adultos). A educação de adultos é um ponto que costuma ser (infelizmente) ignorado, como que desnecessário, caro, quando é exatamente o contrário. Pois lida com gente “diferente”, mais crítica, mais vivida, mais experiente, que já experimentou muito sua realidade e quer aprender mais, sabendo que esse aprendizado vai lhe dar poder para fazer algo que nunca pode fazer antes. E que também não vai aceitar “qualquer coisa”, obrigando aquele que (se algum dia) “ensinou design”, se realmente quiser, terá que re-aprender a ensinar.

Antropofagia no Design de Interação

O Instituto Faber-Ludens publicou um ensaio histórico sobre o conceito de Antropofagia, o canibalismo cultural proposto por Oswald de Andrade e outros modernistas. A brincadeira com o suposto canibalismo indígena tem o objetivo de afirmar a transformação de conceitos importados de outros países para a realidade brasileira.

Na biblioteca do Instituto Faber-Ludens, há um precioso exemplar da coletânea Revista de Antropofagia.

A Antropofagia foi usada como tema para o Tropicalismo nos anos 70 e na Cultura Digital, anos 2000. O Faber-Ludens faz parte dessa nova leva de criadores culturais que consideram a tecnologia parte essencial da cultura. O desenvolvimento tecnológico deve estar em sintonia com a cultura do país. Ao invés de estigmas, jeitinho e gambiarra podem ser diferenciais culturais no mercado global.

Um projeto que ilustra bem essa orientação, é o Olho no Olho, uma câmera afixada na bunda de uma mulher que quantifica quantas vezes ela foi observada. Este projeto é uma boa digestão do Rear View Los Angeles.

http://www.youtube.com/watch?v=Q2Kk7TVK_F4