O nome poderia ser “Design liberto”, “aberto”, libertário”, ou alguma outra nomenclatura a ser definida. Design livre, aqui, é a mãe que ensina o filho a cozinhar, ao invés de fazer a comida que a filho gosta (Centrado no Usuário) ou chamar o filho para cozinhar junto (Design Participativo).
É um passo para uma maior aproximação da cultura do design com o hack e a gambiarra, onde quem não gosta de algo pode alterar, arrumar, melhorar, transformar ou personalizar.
No Design Centrado no Usuário, um grupo de designers volta seu olhar para os usuários. No Design Participativo, o designer se junta aos usuários para projetar. No Design livre, proponho que a proposta é de que “designers” transformem “usuários” em designers, problematizando, inclusive, estas categorizações.
A partir daí, aqueles primeiros designers apenas colaboraram, assessoram e sugerem ideias para o projeto que estes usuários, agora são designers, vão desenvolver.
Esta proposta surge na discussão em torno dos pontos fracos encontrados em metodologias como a do Design Centrado no Usuário. Ao perceber que ele gira em torno de uma espécie de “Design centrado em Outros“, resultando em insuficiências (que tentam, por exemplo, ser resolvidas com pesquisas sobre usuários), porque não pensar em algo mais próximo do “Design centrado em Mim”, aproveitando os pontos positivos que este oferece?
Porém, tão difícil quando conceber o “Outro”, também há enormes dificuldades na concepção do “Mim”. Então, juntando os dois, podemos explorar as possibilidade de fazer um “Design pensando em Nós”, ao invés do “Design centrado Neles”.
Imagine o Design Livre como uma abordagem de Design Social. Ou, então, como um serviço. Talvez este seja apenas um modo de resumir os mais evidentes problemas de algumas abordagem do design à um problema de ensino e educação. O que interessa, nesta proposta, é começar a pensar em novas propostas de design, que ajudem a criar uma sociedade mais crítica e dê poder para as pessoas.
[Via Gonzatto: Design Livre: processo aberto, desenvolvimento liberto (este texto foi publicado pela primeira vez no blog de Rodrigo Gonzatto no site do Instituto Faber-Ludens, em julho de 2009)]
interessante revistar o texto! pode ser uma boa pensar também no design centrado na humanidade para contrapor com o design centrado no usuário e o design participativo. de que forma o design centrado na humanidade se aproxima ou se distancia do design livre? me parece que o design livre, por estar muito perto do conceito do faça você mesmo (DIY) ainda é mais libertário, ao dar o poder de fazer ao próprio usuário. Afinal somos todos designers, não?
Esse texto foi o primeiro publicado sobre a perspectiva de Design Livre que a gente vinha desenvolvendo no Faber-Ludens na época.
Eu acho que o lance do Design Livre é justamente não ser centrado. Ter múltiplas formas de pensar, fazer e usar, como bem observou o Hugo Cristo no livro Design sem Designer.
Um ponto interessante que ele coloca também é que, em sistemas complexos (uma cidade por ex), não dá pra dizer que existe um designer projetando. O projeto é resultado de uma multitude de pequenas ações que contribuem para o todo complexo, um design que emerge de diversas ações situadas, tal como a mãe que ensina o filho a cozinhar que o Gonzatto falou.
Isso é muito diferente do âmbito global que o Design costuma trabalhar. O produto é um só para muitas pessoas diferentes. É uma generalização baseada numa imagem do usuário e suas necessidades bastante difusa. O Design Centrado no Usuário ajuda a dar mais corpo, a situar um pouco mais essa imagem do usuário, porém, não é o usuário que constrói essa imagem. Essa construção feita pelo usuário acontece no Design Participativo, mas no Design Livre não faz sentido em falar de usuários.
Agora por outro lado, se todos forem designers, também não faz sentido em falar de designers. Aí seria melhor um Design sem Designer, como sugere o Hugo.
Eu ainda acho que podemos fazer a distinção entre designers de ferramentas (metadesigners) e especialistas de domínio (designers/usuários), que é o que tentei rabiscar nesse artigo http://fredvanamstel.com/blog/the-designers-role-in-a-free-design-world
Muito legal revisitar este texto e perceber a trajetória das discussões em torno desta “nomeclatura”, Design Livre 🙂
Este texto nasceu durante as aulas de Metodologia da Pesquisa durante a especialização em DxI no Faber-Ludens, quando estudamos Design Centrado no Usuário. Foi influenciado pelas discussões e projetos da comunidade do Faber-Ludens da época, em especial a atuação do Frederick em incentivar que os projetos fossem realizados abertos, on-line, com o convite à participação (um exemplo que marcou na época foi o projeto Cubezilla pro Mozilla Labs). O que estava sendo feito não dava pra chamar só de Centrado no Usuário, Participativo (ou “Genius Design”).
Creio que existam diferenças para perspectivas mais abrangentes do Centrado no Usuário, como Centrado no Ser-Humano, Centrado na Humanidade. Design Livre não como um design “amplo” e “unificado” (não apenas tentar “aumentar o centro”), mas diverso e distribuído. Neste sentido concordo com o Fred em pensar fora dos centros. Descentrar, e olhar as periferias. Aliás, o Hugo Cristo tem publicado textos bem interessantes discutindo o design com a noção de nucleo/periferia
http://hugocristo.tumblr.com/post/42370936934/design-sem-designer-nucleo-e-periferia-3?og=1
No texto deste post aquim em específico, propõe não projetar pelo outro, mas com o outro com o objetivo de que este não dependa do designer para projetar. Eu mudaria um tanto este texto hoje, lógico (rs) para permitir ver o projetar acontecendo sem a figura do designer no meio. Acho legal a ideia que o Fred colocou no artigo dele: Design Livre como “libertar o design do designer”. Lembra que liberdade está ligado à autonomia. Há projeto sem designer, mas não sem alguém projetando. Um dos esforços que eu e o Fred temos feito é encontrar casos que designers entendam como design, feito sem designers. (é, a noção de “designer” vai ficando cada vez mais borrada… )
A proposta deste 1o texto, de marcar o Design Livre como um projeto “para mim/para nós”, atualmente venho aproximando a um conceito existencialista de Álvaro Vieira Pinto, da “produção para si”: cada pessoa produz a sua existência, e projetar é uma capacidade humana fundamental para esta produção. Nesta perspectiva, o ser-humano não é algo pronto, acabado: cada um está se transformando, se fazendo humano. É um argumento bem conceitual, mas como ficaria um Design Centrado na Humanidade se considerarmos essa perspectiva de que a humanidade é variável, que há diversas maneiras de ser-humano?