Eu e Gonzatto publicamos um artigo sobre Design Livre na XRDS: Crossroads, revista dos estudantes de Computação da ACM. Fizemos um apanhado histórico da trajetória recente do Design Livre no Brasil e traçamos as seguintes sugestões:
Design não é a aparência de algo ou um estágio (inicial ou final) de um processo de desenvolvimento. Design é uma atividade que cria coisas no mundo, coisas que conectam pessoas com diferentes níveis de habilidades. Se for conduzida por um coletivo, a atividade projetual encerra um grande potencial para a inovação social.
Negociação é uma parte inerente da atividade projetual. Estimular conversas com implicações de design em espaços públicos é uma maneira poderosa de produzir o que as pessoas querem para elas mesmas.
Ter múltiplos espaços para diálogo é um requerimento para habilitar a diversidade entre os participantes. Nem todo mundo se sente confortável se há apenas uma maneira de participar.
A motivação para fazer coisas novas não desaparece quando as coisas já estão prontas para usar. Os projetos de Design Livre não começam ou terminam com coisas. A coisa é só um meio para atingir o objetivo de transformar a vida.
Design livre is a conversation among Brazilian people interested in recognizing the design made by everybody with the intention of scaling up scattered design efforts. Design livre approaches the matter from a cultural standpoint, positioning design as key activity for resisting the globalization of culture in Brazil. The globalized as much as the localized design knowledge are cannibalized, digested, catalyzed, and brought to action. This conversation recovers topics raised by the century-old Brazilian modernism, which contended radical appropriation of foreign ideas, inspired by the Brazilian native people who ate the first colonizers.
Quando estávamos escrevendo o livro Design Livre, em janeiro de 2012, tinha acabado de terminar uma especialização em Design de Interação na PUC-Minas. E o trabalho era justamente sobre o tema, olha o título; Inovação no Design de Interação: Design livre para modelos sustentáveis. Tratava o design livre como processo de inovação que podia ser utilizado para projetos de design sustentável e emocional.
À época não disponibilizei o trabalho, já que a própria banca recomendou tentar aprová-lo em um mestrado. Os temas eram muito densos e novos, por isso seria ideal ter mais tempo para estudá-los. Foi o que fiz. Organizei o trabalho em uma pré-projeto de mestrado. Me inscrevi na UEMG, que tinha uma linha de pesquisa voltada para inovação e sustentabilidade. Mas sequer passei da primeira etapa de seleção que era a análise do pré-projeto. Fiquei arrasada…. Será que o projeto era tão ruim assim?
Resolvi verificar e inscrevi o mesmo projeto na seleção do mestrado em design da UnB. Não me lembro bem da nota desta etapa, mas no final do processo acabei passando em primeiro lugar! Como não fazer? Me mudei para Brasília e poucos meses depois fui também selecionada para uma consultoria no Ministério da Justiça. Exatamente na secretaria que articulou junto ao culturadigital.br a consulta do Marco Civil da Internet, em 2009. Todo um novo universo se abria ali. O Participa.br estava sendo lançado e o Gabinete Digital do Rio Grande do Sul estava a todo vapor.
Conversei com meu orientador e resolvi mudar de tema. Daí nasceu a dissertação Democracia 3.0: Interação entre governo e cidadãos mediada por tecnologias digitais, em que faço uma análise das consultas públicas interativas promovidas pelo governo federal a partir do Marco Civil. A partir desse mapeamento foi possível traçar um conjunto de recomendações que compilo no trabalho. Agora sim, tudo disponível e publicado nos links acima!
Mais ou menos nessa época, lá nos idos de 2012, o esboço do Design sem Designer estava começando a tomar forma. De lá pra cá, pude falar do livro e das ideias contidas nele para diversos grupos de alunos, pesquisadores e mesmo audiências não-especializadas.
A segunda edição do livro, bem como a continuação, estão na fila dos projetos-inacabados-e-sem-previsão-de-conclusão-nesta-era. Por isso, resolvi que chegou a hora de deixar o texto circular livremente pra ver onde mais ele poderá chegar.
Nunca pensei em ganhar dinheiro com esse livro, então a venda serviu apenas para manter os custos de hospedagem da página (01 exemplar vendido por mês = hospedagem mensal paga). A ideia sempre foi dialogar com o maior número de pessoas sobre as contribuições (riquíssimas) que o mestrado e o doutorado na Psicologia trouxeram para o meu entendimento sobre o que seria design.
O livro, nas versões gratuitas (Creative Commons) para download, estão disponíveis de agora em diante no meu site: PDF (7mb) e EPUB (3mb).
PS: Se por acaso este livro for útil em alguma discussão, por favor me avise 🙂
Animação produzida pelo estúdio ThinkPublic para mostrar que todas as pessoas em algum momento da vida pensaram como designers e podem pensar ainda mais.
Graças à existência do projeto gráfico aberto, o livro Design Livre pôde ser remixado por Stéphanie Kokotte, aluna do curso de Tecnologia em Design Gráfico da UTFPR.
O projeto ficou muito mais atrativo com as cores e tipografia mais adequadas, porém, faltou liberar o código-fonte. No ISSU não dá nem pra fazer download do PDF ou descobrir em que software a diagramação foi feita. Que pena… seria um material bacana para aprender a fazer projetos gráficos.
Pixelapse é uma plataforma para colaboração em projeto gráfico e tridimensional. A novidade é o controle de versão otimizado para marcar e comentar diferenças visuais entre objetos. A plataforma é focada no mercado corporativo de design, porém, existe também uma área para projetos abertos. Não fica claro porque as pessoas deveriam compartilhar seus arquivos, mas a possibilidade está lá.
Este ano a rede de laboratórios de fabricação digital iniciada pelo MIT completou 10 anos. O documentário mostra como e por que os laboratórios se espalharam. Além de entrevista com pioneiros, o documentário inclui entrevistas com pensadores como Bruce Sterling e Peter Troxler. Uma excelente introdução a esse novo espaço propício ao desenvolvimento do design livre.
O projeto Open Structures é uma iniciativa holandesa para definir uma série de componentes para criação de estruturas arquitetônicas ou de produtos. Os componentes são projetados para funcionar da maneira mais genérica possível, permitindo os mais diferentes usos. Um exemplo de estrutura criada pelos visitantes da exposição Designing Scarcity do Nieuwe Institute
Todos os componentes devem obedecer a regra do grid de padronização, para garantir sua compatibilidade com outros componentes. Assim, cada contribuição ao sistema enriquece todas as outras.
Junto com colegas, Jesse está começando um novo projeto intitulado hackeando os objetos de casa. A proposta é desenvolver produtos baseado no princípio de design paramétrico, ou seja, projetar componentes genéricos que podem ser customizados de acordo com parâmetros pré-definidos. Esses parâmetros podem ser combinados de diferentes maneiras, gerando variações de um mesmo produto. A ideia é que o próprio usuário tenha a capacidade de fazer essas mudanças.
Ivan Illich é um pensador controverso, que tem diversas críticas (exemplo1 e exemplo2) a instituições como a medicina (e também a educação, os transportes, por exemplo). Uma das observações a partir de seu pensamento, é de que o monopólio profissional impede que o conhecimento científico seja partilhado. Pensemos em uma questão como a da saúde. Se a saúde for questão apenas científica (monopolizada pela ciência da saúde), ou seja, de cientistas que escolhem o que pesquisar e publicar (e médicos, que posteriormente, diagnosticam e aplicam esse conhecimento), então os leigos (que são não-cientistas) não teriam o que tratar desta questão, pois o conhecimento científico tem que circular entre os envolvidos com a ciência. Existem diversas estratégias para fazer essa separação entre cientistas e não-cientistas: fazer da linguagem (“rigor”) científico algo inacessível e abstrato, utilizar métodos de pesquisa que distanciam observador/objeto de pesquisa, fazer o conhecimento científico circular em espaços restritos etc. O problema é que a questão da saúde definitivamente não é uma questão exclusiva de cientistas, pelo contrário: é de enorme interesse social.
A ciência é uma das formas de trabalhar o conhecimento, mas não é a única. E na sua existência concreta a ciência enquanto instituição não dá (e nunca irá dar) conta de todas as diversas demandas do dia a dia das pessoas. Ela tem suas políticas, enviesamentos, suas pautas, seus interesses e direcionamento de investimentos, que estão ligados às diversas características, inclusive de classe, de quem é cientistas, pesquisador ou tem acesso a este conhecimento.
Isso poderia ser diferente? Uma via é o próprio debate sobre qual o conhecimento produzido. Sabemos que o conhecimento científico não é cumulativo e esta crítica à própria ciência já é incorporada pela Ciência (ex.: ver Thomas Kuhn). Mas será que dá pra confiar apenas nos cientistas, pesquisadores e profissionais (como médicos, professores), quando a própria formação nas áreas tem barreiras profundas de classe, poder econômico e social (ex.: formação de médicos)? É preciso também problematizar quem está/pode/consegue/realiza este debate, e quem pode fazer/estudar ciência, publicar e pesquisasr. Afinal, para questionar o conhecimento científico, para discutir o que a ciência pensa e faz, é preciso ter acesso a este conhecimento. O conhecimento científico circula geralmente em espaços inacessíveis ao público em geral, como em artigos em meios pagos – e caros. Até mesmo médicos podem ficar sem este acesso.
Enquanto o conhecimento científico circular só entre cientistas, pesquisadores e instituições ligadas à ciência, como a universidade, é preciso saber como se faz essa ciência e quem a controla (raramente este questionamento aparece nas principais mídias, pois quando vão falar de um assunto, prevalece a fala do ‘especialista’). Porém, a própria Ciência poderia ter mais participação social e controle democrático (no que se investe, o que se prioriza, o que se estuda, quem estuda, para quem se pesquisa), mas infelizmente não é o que acontecem geral. Muita atenção: este comentário não é anti/contra a Ciência: o que argumento é que ela não é neutra, ou seja, é preciso pensar historicamente, situadamente, para quem o conhecimento e práticas científicas geralmente são produzidos.
Há a situação de dependência, para pesquisas sérias, de instituições que paguem a compra de periódicos (produzido pelos proprios cientistas, no Brasil geralmente financiados pelo proprio governo que tem que pagar por eles). Em contraponto a isso, existem iniciativas como o Open Science (Ciência aberta):
Na questão da medicina, existe um trecho deste texto do Ivan Illich que diz “destruição do potencial cultural das pessoas e das comunidades para lidar de forma autônoma com a enfermidade, a dor e a morte”. O quanto do conhecimento popular, útil e necessário, se perde, invisibiliza ou é aniqulidado quando somente o conhecimento tecno-científico (dos cientistas, pesquisadores e profissionais) é considerado válido?
São inúmeros os casos do conhecimento científico entrar em embate com o popular. E desestruturar comunidades (ver livro Golem a Solta). As questões populares terão análise científica? (e o contrário?) Se sim, de que áreas? (importante: há interdisciplinariedade? medicina será analisa apenas por este campo do conhecimento, ou por computação, ciência sociais, psicologia e design? há investimento, estimulo nessas áreas tbm?).
O que acontece quando população em geral não tem acesso ao conhecimento científico, apenas tendo como interface com a Ciência a posição de receptor das práticas profissionais derivadas desse conhecimento? Ficam dependentes de um grupo que não vai dar conta de atende-los e terão que se valer de métodos mais distantes daqueles considerados pelo discurso cientifico, e ainda serem criticados pelos cientistias/pesquisadores/profissionais por isso?
Este texto é uma reformulação inicial de um rascunho que escrevi certa vez (publicado apenas como comentário de Facebook) sobre o Ato Médico.
O design livre na moda. Conheça a máquina que tricota uma roupa projetada no computador. Como exemplo de uso, o designer Gerard Rubio sugere intervenções em lojas de marca multinacionais trocando roupas fabricadas por trabalhadores mal pagos em países da Ásia por roupas produzidas localmente. Será que essa moda ética pega?