Fichamentos sobre “plágio” no livro Distúrbio Eletrônico

Selecionei alguns trechos sobre plágio do capítulo 4 (Plágio utópico, hipertextualidade e produção cultural eletrônica) do livro Distúrbio Eletrônico,  escrito pelo Critical Art Ensemble e (publicado no Brasil pela editora Conrad). Criei este post para servir de complemento a este texto do Emílio.

O plágio tem sido há muito considerado um mal no mundo cultural. Tipicamente, tem sido visto como um roubo de linguagem, idéias e imagens executado pelos menos talentosos, freqüentemente para o aumento da fortuna ou do prestígio pessoal. No entanto, como a maioria das mitologias, o mito do plágio pode ser facilmente invertido. Talvez aqueles que apóiam a legislação sobre representação e a privatizado da linguagem são suspeitos. Talvez as ações dos plagiadores, em determinadas condições sociais, sejam as que mais contribuem para o enriquecimento cultural. Antes do Iluminismo, o plágio tinha sua utilidade na disseminação das idéias. Um poeta inglês poderia se apropriar de um soneto de Petrarca, traduzi-lo e dizer que era seu. De acordo com a estética clássica da arte enquanto imitação, eta era uma prática perfeitamente aceitável. O verdadeiro valor dessa atividade estava mais na disseminação da obra para regiões onde de outra forma ela provavelmente não teria aparecido, do que no fortalecimento da estética clássica.  (p.83)

O plágio freqüentemente carrega um peso de conotações negativas (particularmente na classe burocrática). Enquanto a necessidade de sua utilização aumentou com o passar do século, o plágio foi camuflado em um novo léxico por aqueles desejosos de explorar essa prática enquanto método e como uma forma legítima de discurso cultural. Readymades, colagens, found art ou found texto, intertextos, combines, detournment e apropriação – todos representam incursões no plágio. De fato, esses termos não são sinônimos perfeitos, mas todos cruzam uma série de significados básicos à filosofia e à atividade de plagiar. Filosoficamente, todos se opõem a doutrinas especialistas de produção de textos: todos pressupõem que nenhuma estrutura dentro de um determinado texto dê um significado universal e necessário. Nenhuma obra de arte ou de filosofia se esgota em si mesma, em seu ser-em-si. Tais obras sempre estiveram relacionadas com o sistema de vida vigente da sociedade na qual se tornaram eminentes. (p.85)

O plágio historicamente se colocou contra o privilégio de qualquer texto fundado em mitos espirituais, científicos ou quaisquer outros mitos legitimadores. O plagiador sempre vê todos os objetos como iguais, e assim horizontaliza o plano do fenômeno. Todos os textos se tornam potencialmente utilizáveis e reutilizáveis. Aqui temos uma epistemologia da anarquia, de acordo com a qual o plagiador sustenta que se a ciência, a religião ou qualquer outra instituição social impossibilita a certeza além do domínio do privado, então é melhor dotar a consciência de tantas categorias de interpretação quanto possível. (p.87-88)

O gênio de um inventor como Leonardo da Vinci residia em sua capacidade de recombinar os sistemas até então separados, da biologia, matemática, engenharia e arte. Ele era mais um sintetizador do que um criador. Existiram poucas pessoas como ele porque a habilidade de reter tantos dados em uma única memória biológica é rara. Agora, no entanto, a tecnologia da recompilação está disponível no computador. O problema agora para os candidatos a produtores culturais é conseguir ter acesso a essa tecnologia e informação. Afinal, o acesso é o mais preciso de todos os privilégios, e é, portanto, muito bem guardado, o que por sua vez no faz pensar se para ser um plagiados de sucesso é preciso ser também um hacker bem-sucedido. (p.89-90)

O sonho do plagiador é ser capaz de baixar, mover e recombinar textos com comandos simples e de fácil uso. Talvez o plágio legitimamente faça parte da cultura pós-livro, já que apenas nessa sociedade ele pode tornar explícito o que a cultura do livro, com seus gênios e auteurs, tende a ocultar:  que a informação é mais útil quando interage com outra informação, e não quando é deificada e apresentada no vácuo. (p.90)

Na Inglaterra do século XVII, quando o direito autoral apareceu pela primeira vez, o objetivo era reservar às próprias editoras, para sempre, os direitos exclusivos de imprimir certos livros. A justificativa, é claro, era de que, quando usadas em um obra literária, a linguagem teria a personalidade do autor imposta sobre ela, marcando-a dessa maneira como propriedade privada. Sob o abrigo dessa mitologia, o direito autoral floresceu no capitalismo tardio, estabelecendo os precedentes legais para a privatizado de qualquer item cultural, fosse ele uma imagem, uma palavra ou um som. Assim o plagiador (até mesmo o da classe tecnocrática) é mantido em uma posição profundamente marginal, a despeito dos usos inventivos e eficientes que sua metodologia possa ter em relação ao estado corrente da tecnologia e do conhecimento. (p.98)

O presente requer que repensemos e representemos a concepção de plágio. Sua função tem sido há muito desvalorizada por uma ideologia que tem pouco lugar na tecnocultura. Deixemos que as noções românticas de originalidade, genialidade e autoria permaneçam, mas como elementos para produção cultural sem nenhum privilégio especial acima de outros elementos igualmente úteis.  (p.98)

Quem pode ser um designer livre?

Antes de falar sobre design é importante esclarecer de qual design está se falando. Podemos entender o design como um processo (planejar, desenvolver, projetar), como o resultado desse processo (instruções, desenho, modelos, protótipos) ou como a solução (produto, serviço ou benefícios gerados por eles para as pessoas). O design livre abrange dois deles, o processo aberto para participações e os resultados do processo livres para consulta. A solução estar disponível ou não para usufruto e por qual preço depende dos participantes de cada projeto.

Mas o design livre só faz sentido se considerarmos um quarto entendimento. O design como “a capacidade humana de dar forma ao ambiente em que vivemos de maneira nunca antes vista na natureza, para atender às nossas necessidades e dar sentido à vida” – Heskett. Esta capacidade está na essência da existência da espécie humana, pois é uma da características que diferencia o ser humano dos outros seres vivos – junto com a linguagem – e tem sua manifestação identificada desde o tempo das sociedades humanas mais primitivas.

Desde os tempos antigos o ser humano projetou e construiu coisas para seu uso: ferramentas, armas e roupas. Quando as pessoas deixaram de ser nômades para serem agricultores e criadores de animais e estabeleceram-se em comunidades maiores e mais permanentes, alguns indivíduos demonstraram ser mais talentosos em projetar e fazer coisas específicas – seja pela herança genética, seja pelo desenvolvimento social e educacional. Esta especialização permitiu o avanço das habilidades para projeto e manufatura de casas, utensílios, móveis, roupas, jóias e outros produtos.

À medida que a sociedade ficava mais complexa, as atividades de construção das coisas separava-se das atividades de projetá-las e planejá-las. Estas novas atividades mereciam uma ponderação entre a concepção da ação a ser tomada e a forma de conduzi-la, bem como uma avaliação dos resultados da mesma. Neste momento, o design passou a se sobressair como atividade profissional e as especialidades de design que conhecemos hoje como diferentes profissões (por exemplo, engenheiro, arquiteto, alfaiate, designer gráfico, designer de produto etc.) gradualmente começaram a surgir.

Contudo, nas atividades mais simples e cotidianas, as pessoas continuam utilizando esta capacidade de agir de forma ativa e intencional, interferindo e transformando o seu entorno. Por exemplo, quando elas planejam as ações do dia, escolhem uma roupa, arrumam seus quartos, preparam a comida, resolvem problemas corriqueiros, entre outras. O design como capacidade também está presente em atividades um pouco mais complexas, como o empresário que organiza a empresa em um formato diferente, ou o analista de sistemas que cria um processo para reduzir o desvio de malas nos aeroportos, ou, ainda, o geneticista que desenvolve um novo tipo de maçã mais resistente às intempéries.

É esta capacidade que qualifica todas as pessoas, profissionais do design ou não, a serem potenciais participantes dos designs livres.

 
BAYNES, K. How children choose: children’s encounters with design. Loughborough: DD&T / Loughborough University, 1996.BONSIEPE, G. Design do material ao digital. Florianópolis: FIESC/IEL, 1997.

CROSS, N. Desenhante: Pensador do Desenho. Santa Maria: sCHDs, 2004.

FONTOURA, A. M. EdaDe: a educação de crianças e jovens através do design. 2002. 337 f. Tese (Doutorado em Engenahria) – Departamento de Engenahria de Produção e Sistema, Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2002.

HESKETT, J. Design. São Paulo: Ática, 2008.

MAGALHÃES, Claudio Freitas de. Design estratégico: integração e ação de design industrial dentro das empresas. Rio de Janeiro: CNI/SENAI/CETIQT, 1997.

POTTER, N. What is a designer: things – places – messages. Londres: Hyphen Press, 2002.

Seminário + Minicurso Ecologia do Uso

Sobre o Evento
Como realizar na prática a proposta do livro Design sem Designer? Este é o objetivo do evento que consiste em um seminário teórico e um minicurso prático onde os leitores do livro poderão discutir e participar de experiências de projeto na perspectiva da cognição corporificada.

Programação
Sexta, 26 de Abril das 19 às 21h: Seminário (2h)
Sábado, 27 de Abril das 9-13h e 14-18h: Minicurso (8h)

Local
Universidade Federal do Espírito Santo
Centro de Artes – Campus Goiabeiras
Vitória, ES

Informações
http://symbolik.com.br/ecologiadouso

Design Livre Primitivo

No passado, todos os criadores foram considerados artesãos. Não foi até faz 500 anos que os primeiros artistas surgirem da face das suas criações para se ganhar um lugar privilegiado dentro de nossas sociedades. Naquele ambiente primitivo, muitos elementos relacionados à criatividade ficaram juntos de uma maneira natural, ou seja, sem nenhum método ou restrição estabelecida, criando assim uma configuração de design sem restrições que deu lugar ao desenvolvimento cultural na escala local: um design que é naturalmente aberto. Tienda de souvenirs Um bom exemplo que chama a minha atenção é do Nahuizalco, uma cidade ao Oeste de San Salvador, em El Salvador. A principal fonte de receita é o design e fabricação de objetos de madeira: artesanatos ornamentais, utensílios e mobiliário. Os artesãos neste lugar tem aprendido tudo através de distintas fontes, sendo as mais importantes a inovação local, a infuência entre si dentro do sistema, e as influências externas. Hoje em dia as coisas não funcionam na mesma maneira, pelo ‘desenvolvimento’ de conceitos tais como a visão na propriedade privada da criatividade, assim como a criação de restrições sistêmicas à influência mútua entre os criativos. Algumas das condições que limitam esta configuração multidimensional da inovação são:   1. A negação da coletividade da inovação Como eu disse ao principio, a expressão criativa tem trocado do propósito de ser um elemento mais da sociedade, para ficar num staus superior. A visão romântica de um gênio louco, trancado no seu quarto até achar a epifania foi parte fundamental de esta visão, e não foi sem os resultados de pesquisas recentes da antropologia como contexto da inovação que tem permitido negar (pelo menos academicamente) esta ideia. Por exemplo, de acordo com R. Keith Sawyer (Explaining Creativity, 2006), é importante analisar todas as influências externas ao indivíduo, o que quer dizer que o ato de criação é mais social do que todos nós pensávamos. “Para explicar a criatividade no somente devemos incluir estes enfoques contextualizados; em muitos casos devemos começar com eles”.

2. O fechamento parcial ou total das vias de transferência do conhecimento e aprendizagem Um dos principais problemas aparentes dentro de um sistema aberto é o plágio (muitas vezes atrevido demais) das obras. Por exemplo, para sociedades antigas, um dos métodos de pesquisa de informação cultural é a comparação geográfica entre as expressões artísticas, para desenhar uma linha de tempo entre obras similares entre artistas. A dizer a verdade, o plagio é um dos principais meios de desenvolvimentoartístico entre artesãos, ao ponto de que em muitos casos existe muito pouca variação entre as expressões artísticas entre diferentes autores. A solução para isto, para muitas pessoas, e o fechamento dos processos e ainda dos produtos para outros produtores, o isolamento dos estilos particulares e a criação de vantagens competitivas através dos segredos comerciais. Ao mesmo tempo isso desacelera a criação coletiva e aumenta os custos da produção, sem mencionar a fragmentação da identidade coletiva social.

3. A apropiação das expressões artísticas através da propriedade intelectual Entretanto que existem muitas abordagens que justificam a propriedade intelectual, o mais questionável tem que ver com a remuneração para aquele criador que tem investido esforço para a criação das suas obras. Porém, desde um ponto de vista social, uma grande parte deste conhecimento e esforço esta baseado na influência feita pelo entorno, de modo que a valoração do esforço, e portanto, da validade da propriedade como é avaliado hoje em dia. A inovação foi possível antes sem a necessidade de restrições ao uso das obras, ou também em muitos casos da copia (interna ou desde sistemas externos) foi importante para a inovação, e continua assim até hoje. A industria da moda é um exemplo de como a criação pode permanecer a mesma num oficio sem precisar de apelar à propriedade intelectual, permitindo assim o remix de influências de todos os tipos. Entrada de la tienda Como conclusão, o design aberto oferece um caminho já anteriormente recorrida por nossas sociedades. Procura a criação e disseminação de influências e a inclusão do criador como protagonista e membro da sociedade, sempre quando as maiorias podem ser também protagonistas de essas mesmas historias. Sharing is caring.

Headset para Eye-tracking

Eye-tracking é uma técnica que mensura o ponto focal da visão do usuário numa tela de computador. Isso pode ser usado de várias maneiras. Pode-se criar mapas de calor (heatmaps) mostrando as áreas onde a visão da pessoa ficou mais tempo parada. As imagens abaixo mostram a diferença de pontos de interesse para homens…

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E para mulheres:

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Outro uso do eye-tracking é para estudos de usabilidade. A imagem abaixo é de um estudo que demonstra como a diferença de intenção do usuário (buscar informação, navegar e fazer transações) reflete um padrão de atenção diferente.

A tecnologia para mensurar o ponto focal do usuário é cara. Os monitores mais baratos da Tobii custam cerca de R$ 5 mil e são baseados em software e hardware proprietário.

Dois alunos do Mestrado em Arquitetura do MIT criaram uma alternativa de baixo custo baseada em hardware e software livre chamada Pupil.

A proposta é que o usuário monte o seu próprio headset. Eles fizeram uma lista de componentes necessários que não ultrapassam U$ 90, muito mais em conta que as soluções comerciais. Explicam como desmontar uma webcam e retirar o sensor necessário e como afixar no headset.

Instruções finais para montar o headset

As peças fixas do headset podem ser encomendadas via impressão 3D, porém, o código-fonte dos arquivos não estão abertos. Veja um vídeo do sistema em funcionamento.

O projeto ainda está longe de oferecer a mesma facilidade de captura e análise que as soluções comerciais oferecem, porém, é um projeto aberto à participação e pode evoluir junto com a comunidade de usuários.

Superando as limitações do Design Thinking

Design Thinking é um termo usado inicialmente na academia para definir o modo particular como designers projetam, resolvem problemas e criam soluções. Recentemente, o termo foi ressignificado por escritórios de Design de renome com o objetivo de comercializar este modo de pensar como um serviço, não um produto.

Índice de publicações contendo o termo design thinking na Internet. Via Google Trends.
Índice de publicações contendo o termo design thinking na Internet. Via Google Trends.

Os escritórios sofriam com a alta competividade, enquanto os clientes precisavam economizar contratação de terceiros devido à crise. Design Thinking acabou virando sinônimo de levar o modo de pensar do Design para quem não é designer, com o objetivo de maximizar a inovação dentro das organizações — ao contrário de terceirizar com os escritórios de Design. Os escritórios viraram consultorias e o marketing esvaziou o termo Design Thinking de significado. Um dos grandes defensores do Design Thinking, numa pura jogada de marketing, chegou a afirmar que o Design Thinking é uma falha.

Se o Design Livre compartilha essa intenção de potencializar o design feito por designers sem formação específica, será que não corre o risco de terminar da mesma maneira? 

Sim, é possível, mas vejo 3 limitações que fizeram o Design Thinking morrer na praia. Enfatizo-as porque acredito que, sem elas, o Desing Livre tenha mais fôlego.

1) O Design Thinking é elitista

Ele surgiu na academia, a elite intelectual da sociedade. Ele celebra o designer como ser criativo e define o usuário como um fornecedor de informações e receptor de produtos. O Design Thinking não reconhece que exista pensamento criativo na outra ponta do projeto.  Se existisse, seria chamado “Use Thinking” e consistiria de escolhas de opções de uso.

A figura abaixo, um clássico para explicar o que é Design Thinking, deixa clara a diferença entre classes: o Design Thinking explora várias possibilidades de produção, enquanto que o usuário se contenta com as opções de uso. A estrutura em árvore representa uma evolução, enquanto a estrutura em grama representa apenas uma escolha dentre opções pré-definidas pelo objeto.

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Defensores do Design Thinking contemporâneos defendem a co-criação com usuários, design participativo, etnografia e outras formas de incorporar a criatividade do usuário no projeto, porém, o Design Thinking continua sendo um fenômeno que acontece dentro da organização, não fora. A disseminação do Design Thinking se dá por consultorias que mesmo pequenas empresas não conseguem pagar, que dirá do usuário.

Como todo produto voltado para a elite, o Design Thinking vai sair de moda mais cedo ou mais tarde.

2) O Design Thinking é fechado

Mesmo que se reconheça que o usuário também pode fazer Design Thinking (ou talvez nesse caso seja melhor chamar de Design Doing), e transformar o produto com gambiarras e customizações, as ideias deixadas para traz ficam inacessíveis. Os dois processos de design se conectam apenas pela existência de um objeto que nada diz sobre de onde veio, como veio e porque veio. Em suma, o código-fonte não está disponível.

20130221-100807.jpg Embora o projeto possa continuar e o martelo virar uma máquina, os processos subsequentes não poderão se beneficiar de todo o Design Thinking que veio antes. Ideias rejeitadas poderiam ter adquirido valor em contextos não considerados. Isso pode acontecer até mesmo dentro de uma única empresa, como no caso do desenvolvimento de produtos em segredo por uma equipe de inovação treinada em Design Thinking que acaba sendo, no final, cancelado e a empresa não ganha nem com o aprendizado.

3) O Design Thinking é centralizado

Se é elitista e fechado, é claro que é também, centralizado. O problema dos sistemas centralizados é sua fragilidade. Se a empresa não consegue colocar o produto no mercado, todo o Design Thinking pra trás é inútil. Se o desenvolvimento continua centralizado na empresa original, atualizações e novas versões vão demorar pra acontecer, isso se houverem. Dificilmente o produto será transformado em outra coisa, pois isso desafia a autoridade do centro. Para que o centro continue centro, ele deve concentrar algo que a periferia deseje, no caso do Design Thinking, o conhecimento, este que se vende nas consultorias.

E o que pode ser o Design Livre?

Se começarmos a partir do Design Popular (ou Vernacular) e potencializarmos ele com o Design Thinking, mantendo o processo aberto e descentralizado, então podemos dar uma sobrevida, tanto ao Design Livre quanto ao Design Thinking. Para manter o processo aberto, é importante que ele seja realizado em público e que o código-fonte e outras formas de documentação estejam disponível. O processo se ramifica a cada ideia e, virtualmente, não termina nunca.

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Estas ideias estão sendo testadas na Plataforma Corais. Lá você tem uma Árvore do Conhecimento com todos os principais Métodos de Design cultivados no Design Thinking, porém, não é necessário passar pela árvore para começar a desenvolver projetos. Os projetos são públicos e qualquer um pode aprender com os códigos-fontes e discussões. A gambiarra é celebrada como inovação e novas funcionalidades são desenvolvidas para oficializá-las. E o mais importante: não é preciso pagar um centavo para uma consultoria.

Ao invés de negar o Design Thinking, o Design Livre incorpora-o e utiliza para outros fins. Que outros fins você imagina?

O design como antropologia contemporânea

Aproveitando os debates conceituais que foram recentemente publicados no blog, revi um texto que escrevi em 2011 sobre o design, sua relação com a cultura material e imaterial. Acho que pode ser interessante para o debate sobre o design livre!

“Certa vez tentei explicar meu trabalho para um jornalista, que resumiu minha longa explicação em uma exclamação: você é um antropólogo tecnológico!” (Vicent Kim em “The human factor: revolutionizing the way people live with technology” p.15, 2006).

Introdução

A palavra design está presente no cotidiano contemporâneo de forma recorrente. Há cursos de design gráfico, design visual, design de som, de hipermídia, de jogos, de embalagem, de produto, de moda, de jóias, de ambientes, de interiores, de serviços. Design de interfaces e design de interação, entre outros.

Diante de tanta diversidade, para dar início a esta reflexão analisaremos a origem da palavra. Para tanto recorremos ao ensaio ‘Sobre a palavra Design’ do filósofo Vilém Flusser. Design vem do latim, do verbo designare, ou seja, “etimologicamente a palavra design significa algo como de-signar” (Flusser, p. 181, 2007). Neste sentido, ela carrega em si muito mais o aspecto de projetista do designer do que seu lado mais comumente conhecido que é o ‘daquele que desenha’. Sendo assim pode-se compreender design como a intenção de criar ou modificar algo.

Durante a análise dos significados tanto do substantivo quanto do verbo design Flusser (2007) afirma que “a palavra design ocorre em um contexto de astúcias e fraudes. O designer é, portanto, um conspirador malicioso que se dedica a engendrar armadilhas” (Flusser, p. 182, 2007). Tais afirmações encontram-se distantes do senso comum do que é o design nos dias atuais. Isso ocorre devido ao fato de haver duas escolas de design: o design do Natural e o do Artificial, segundo Bezerra (2008). Citando Hebert Simon, autor do livro The Science of the Artificial, “ele define o Artificial como o que foi concebido pelo ser humano, o resultado de uma ação humana; e o Natural como um produto da natureza” (Bezerra, p.33, 2008). Esta capacidade de criação e construção de simbologismo do ser humano está associada ao conceito de cultura das ciências sociais. Pode-se compreender a cultura como “instância humanizadora, que dá estabilidade às relações comportamentais e funciona como mecanismo adaptativo da espécie” (Velho e Castro, 1978, p. 5). Isto quer dizer que ao estarem inseridas em determinada sociedade as pessoas produzem códigos, verdadeiros aparelhos simbólicos, que interpretam a realidade e dão sentido ao mundo no qual se encontram.

Design e Cultura

É neste contexto que Flusser afirma que “este é o design que está na base de toda cultura: enganar a natureza por meio da técnica, substituir o natural pelo artificial e construir máquinas de onde surja um deus que somos nós mesmos” (Flusser, p. 184, 2007). Se nos atermos a esta afirmação podemos também concluir que “em essência, somos todos designers” (Bezerra, p.28, 2008), já que todos seres humanos são criadores de conceitos e objetos.

Estas reflexões acerca da palavra design se mostram necessárias para ampliarem o conceito, proporcionando a possibilidade de uma compreensão da complexidade envolvida no processo do design e em especial, do design livre. De forma resumida pode-se afirmar que “design significa aproximadamente aquele lugar em que arte e técnica (…) caminhando juntas, com pesos equivalentes, tornando possível uma nova forma de cultura” (Flusser, p. 184, 2007). Por outro lado é preciso ressaltar que “não é fácil explicar ou definir design (…) podemos entendê-lo através de seus aspectos práticos, operacionais ou profissionais. (…) Podemos também ver o design como uma atividade de tradução (…) ou como uma atividade de ordenação e configuração” (Bezerra, p.17, 2008). Independente da abordagem ou ponto de vista, o processo de design é uma atividade humana que evoluiu ao longo dos séculos. Se os primeiros primatas construíam arcos e flechas atualmente construímos coisas intangíveis, tais como os softwares. É dizer o trabalho do design transcende a projeção de artefatos materiais, ainda que ele seja um dos grandes responsáveis pela criação de objetos materiais.

Segundo Flusser (2007) “um objeto de uso é um objeto que se necessita e que se utiliza para afastar outros objetos no caminho (…) um obstáculo para remover obstáculos?” (p. 194) questiona o autor para explicar que “esta contradição consiste na chamada dialética interna da cultura (…) em outras palavras quanto mais prossigo, mais a cultura se torna objetiva, objetal e problemática” (p.197). De fato, a evolução do arco e flecha para interfaces multitoque e softwares auto programáveis contribuiu consideravelmente para o desenvolvimento do design incluindo, por exemplo questões de usabilidade. Portanto, neste sentido talvez caiba a comparação entre o antropólogo e o design de interação, enquanto o primeiro estuda e analisa o homem e a humanidade como um todo, o segundo se dedica a aprender e estudar como os seres humanos interagem com este novo universo do intangível trazido pelas máquinas.

Acima de tudo é importante pontuar que “a noção de design não pode ser resumida em uma palavra e (…) também não pode ser resumida em uma disciplina. Somos estudantes de problemas, de problemas que não definem fronteiras” (Charles Eames, apud Bezerra, p.24, 2008). Destacamos o aspecto de solucionadores de problemas pois este é exatamente o grande desafio de inovação contemporâneo, ou seja, solucionar questões e desafios compartilhados, por meio de metodologias colaborativas, como é o caso do design livre.

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Liberdade

O conceito de liberdade possui várias definições, e uma das que acho mais interessantes é a do filósofo Álvaro Vieira Pinto, presente no segundo volume do seu livro Consciência e Realidade Nacional (1960).

Vieira Pinto analisou a liberdade como categoria do pensamento crítico do desenvolvimento nacional, buscando evidenciar o papel da liberdade na gênese dos atos promotores do desenvolvimento. Vou apresentar aqui minha leitura de duas das principais aspectos deste conceito: a liberdade é libertar e a liberdade é ter escolhido.

Conhecer o mundo é agir sobre ele. E, ao agir no mundo, o mundo é transformado, transformando o próprio ser humano.

O projeto fundador consiste para o indivíduo (…) em assumir o mundo de que é parte, em dispor-se a pertencer a ele, não para contemplá-lo, e sim para modificá-lo. A modificação do mundo, de que se trata, não é uma qualquer, mas a que se evidencia como conquista objetiva de liberdade, numa palavra, como libertação. Logo, o ato livre fundamental é o ato de libertar o mundo. (Vieira Pinto, p.270-271)

A liberdade é uma qualidade dos atos executados pelos seres humanos. Por liberdade entende-se a faculdade de praticar atos livres, sendo atos livres os atos libertadores. Liberdade trata do poder de libertação, de conquista objetiva de liberdade.

A  liberdade se dá pelo ato pelo qual se torna livre: a liberdade é o libertar. A liberdade não é algo disponível à alguns “homens livres”, mas algo que pode se realizar pela ação humana que busca liberdade. A liberdade não é atributo de um ser, mas de um ato. Adquire-se a liberdade quando se contribui com a libertação.

A partir deste conceito, a ação livre não é qualquer ação, mas a que age pela libertação, a que transforma a realidade. Por estar situada historicamente, a busca pela liberdade efetiva não pode ser anteriormente ditada por valores ou princípios imutáveis, mas sim realizada um espaço de ações concreto, transformando-o.

A liberdade não se encontra plena e perfeita, não é característica exclusiva do pensamento de um indivíduo. Ela está ligada a ação do sujeito no mundo concreto e por isso o ato livre não é independente de qualquer condicionamento, mas se encontra situado (e por isso a necessidade de libertação). Portanto, nas palavras de Vieira Pinto, a liberdade não é um bem interior que eleva o homem: o que o eleva é a situação criada pela liberdade.

Para Vieira Pinto a liberdade é ter escolhido,  e não simplesmente o escolher. Para o filósofo, perguntar pela causa da liberdade é formular um problema logicamente insolúvel, porque sua causa ou é livre – e temos aí o regresso ao infinito; ou não é livre, e não poderia dar origem a liberdade. Qualquer critério objetivo para que seja possível definir a liberdade só acontece em situação, na prática dos atos libertadores. Assim, a liberdade não é o escolher ou estar diante de uma escolha a ser feita, mas é agir criando caminhos, perceber que se as escolhas já feitas não libertaram, é necessário agir pela liberdade.

A prática existencial estabelece-se, portanto, dentro da condição de pertencer a um mundo que solicita a nossa ação e, ao mesmo tempo, resiste a ela. Ao tentarmos produzir a nossa ação no mundo, descobrimos dupla possibilidade de fazê-la: ou em conformidade com o estado da realidade, aceitando a solicitação e a resistência, que nos desafiam a alterá-la; ou fugindo a esse estado, negando o desafio, o que vem a ser negando o estar no mundo. (Vieira Pinto, p.263)

Assim, não é possível “encontrar a liberdade” para só então executar atos livres. É na própria ação, na busca por liberdade, que se é livre. No confronto com uma situação concreta, diante de sua história, cada sujeito se depara com sua realidade e, ao decidir trabalhar para transformá-la, deseja se libertar. Da mesma maneira, a busca por liberdade não chega a um fim, pois não está pronta: é feita.

A liberdade não se dá apenas pela libertação individual. Por ser um processo realizado por cada indivíduo em uma realidade que também é a de outros, para ser efetiva deve ser uma conquista social, daqueles que se identificam com sua realidade e, ao se confrontarem com sua história, reconhecem em suas escolhas a liberdade conquistada e a necessidade de agir pela liberdade em uma nova situação, atuam como um coletivo em um projeto em comum para transformar a realidade – libertação.

Propriedade intelectual e impressão 3D

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Finalmente encontrei uma análise embasada sobre as dúvidas que a impressão traz do ponto de vista da propriedade intelectual. Se eu escanear um objeto da minha casa, criar um modelo em 3D a partir disso e imprimir dezenas de cópias, estarei infringindo uma patente? Segundo Michael Weinberg não.

Instead of being transferred from the physical world to the digital world via a scanner, useful objects created in CAD software exist first in a digital world. Once again, as a useful object the object itself (as it would exist physically) is not protected by copyright. Furthermore, even if the design file is protected by copyright, creating a physical version will not infringe on any copyright that exists in the file. No copyright on the design of a useful object extends copyright protection to the object itself. [52] The legal question arises when someone tries to copy the file.

Porém, se o objeto for “criativo”, uma obra de arte, então você tem que pedir autorização.

Unlike scans of useful objects, scans of creative objects are copies of existing works protected by copyright. That has two ramifications. The first is that anyone scanning a creative object needs the permission of the rightsholder of that object. Scanning makes a copy, and copies are exactly what copyright regulates. Even though the scanner is not creating a work eligible for copyright protection, she is still copying the creative object.

What’s the Deal with Copyright and 3D Printing? | Public Knowledge.